










Conhecemos a Clara Sthel em dezembro do ano passado, no Meeting of Favela, que rolou na Vila Operária em Duque de Caxias. O match era inevitável.
Ela se apresentou como jornalista. Nós também. Não demorou para percebermos que Clara é muitas coisas ao mesmo tempo. É, sobretudo, alguém que tem muita coisa a dizer. Alguém com convicções, que olha para os lados e o faz de forma autêntica e criativa, características que se manifestam em tudo que ela produz. Essa é a Clara, de 24 anos, que mora no Rio de Janeiro.
1. Quem é você?
Me chamo Clara, sou jornalista e estou me especializando em branding. Atuo como fotógrafa há um tempinho. Acredito que a fotografia comunica, dependendo do contexto, até mais que um texto escrito. Comecei a me interessar pela fotografia quando estagiava em um jornal sindical e convivi com um fotojornalista, foi ele que me influenciou a comprar uma câmera (é a que eu uso até hoje), meu olhar sobre a cidade têm muitas referências dele já que seu foco sempre se voltou para as favelas, subúrbio e pessoas comuns que transitam pelas áreas populares da cidade. Eu não faço fotos, são as fotos que me faz todos os dias uma pessoa mais sensível e consciente.
2. Quando você está com uma Polaroid na mão, o que atrai seu olhar?
Durante os dias que eu estive com a Polaroid em minhas mãos procurei fotografar de primeira um lugar que eu tenho uma memória afetiva muito gostosa. Logo depois procurei fotografar as pessoas e carregar a câmera comigo para os percursos naturais do meu dia. Fotografei pessoas mas também fotografei situações simbólicas como a kombi cheia de sacos de pipoca, no Parque das Missões (Caxias), nesse dia levamos as crianças para assistir ao filme Pantera Negra. Eu não queria fazer uma foto de criança e sim tentar captar o clima do dia de forma mais simbólica. Fiz um pouco de tudo registrei corpos dançantes, estação de trem, a felicidade de um vice-campeão do carnaval.
3. Quais histórias você quer contar?
Quero contar histórias singelas de partes importantes da cidade. Com foco na zona norte, sou um pouquinho bairrista sim. Cresci ouvindo coisas ruins sobre a minha zona: longe, insegura, pobre, falta educação das pessoas, ausência cultura própria entre outras coisas. Mas nada como circular por todas as áreas e ter o meu próprio conhecimento do Rio. Entender a mecânica de algumas questões sociais e estruturais que nos fazem acreditar que o melhor é sempre o que estar do outro lado (do túnel). Fotografar é também um ato estético/político. No inconsciente coletivo quando falamos de zona norte, oeste e baixada automaticamente é feito um download mental de imagens estereotipadas, e isso só muda se mais pessoas dessas áreas produzirem cada vez mais conteúdos imagéticos que subvertam o senso comum. Já estamos fazendo isso, ainda bem!
4. Dentre as fotos que você tirou, qual sua preferida? Que história ela conta?
A primeira, da estação de trem do Engenho de Dentro. Ela foi reformada recentemente, mas ainda mantém alguns aspectos da sua arquitetura original. Creio que a primeira foto é sobre passado e presente, é sobre mim, mesmo não aparecendo o meu rosto. A estação faz parte de uma tríade simbólica: Escola Municipal Bolívar, Estádio do Engenhão e o trem. Esses três lugares ficam um ao lado do outro. Estudei praticamente vida inteira no Engenho de Dentro, assisti a construção do Engenhão da janela da sala de aula e o trem tem um lugar cativo no meu coração porque me levou a conhecer com mais afinco a baixada quando fiz o projeto Escambo de Ideias em duas escolas municipais em Gramacho e Nova Iguaçu.
5. E das fotos da Fugaz, qual a sua preferida?
Gosto bastante da foto da pracinha no Parque União, tirada pelo Irven Oliveira. Imagino que ele tenha se divertido com a câmera como eu me diverti…
6. O que te influência?
Pessoas da rua, gente idosa, revistas impressas, colagens, rap, mulheres corajosas que eu chamo de “faca na botinha” e meu irmão mais novo. Os livros Cidade Partida e o Artesanato da Intelectualidade.
7. O que é diferente sobre a fotografia instantânea?
Tudo, mas a relação com o tempo é a mais marcante. Não se pode agir na ansiedade, tem que pensar, fotografar com a cabeça e depois com a câmera. Depois de feito você pega na hora a foto, isso é muito louco também, é mais palpável