VIDAS NEGRAS IMPORTAM – Cobertura Cena Bxd

Fotos em destaque por Rapha Sancho, no Largo da Batata, São Paulo. Junho de 2020

No dia 7 de junho, pessoas em diversas cidades pelo Brasil se levantaram contra o racismo e foram às ruas em defesa da democracia. As manifestações anti racistas e anti fascistas ali convocados marcaram uma virada de chave em nossa história. Isso porque, até então, as ruas do país estavam sendo ocupadas por atos antidemocráticos, afrontas diretas às instituições, mirando até mesmo o STF. Quase não se via mobilização popular em contrapartida a esses atos; compreensível, uma vez que atravessávamos – à deriva e sem liderança – a pandemia do Covid-19.

Quando o momento chegou de convocar a população, os organizadores tiveram que assumir também a responsabilidade dos protocolos de segurança e medidas de prevenção ao Coronavírus, preservando a saúde das pessoas alí presentes para exercer seu direito de manifestação. Sabiam também que os atos seriam examinados com lupa pela imprensa, que já não era favorável à convocação. Em São Paulo, os primeiros atos foram convocados por lideranças de torcidas organizadas de diversos clubes. Bem organizados e pacíficos, desdobram-se em novos atos pelo País ao longo do mês de junho.

Rapha Sancho – São Paulo

Nesse sentido, destacamos aqui a cobertura feita pelo coletivo Cena BXD, que mobilizou nove pessoas na produção simultânea de conteúdo entre Rio e São Paulo. A pauta contemplou redação, fotografia e vídeo. O material completo pode ser visto no Instagram clicando aqui. Por lá, os registros do ato são acompanhados de textos autorais assinados por membros da equipe.

A cobertura marca mais um ciclo para o coletivo da Baixada Fluminense, cujo primeiro trabalho nesse sentido foi justamente no Circuito de Mountain Bike de Favelas, realizado em 2015, na Vila Operária, em Caxias. Segundo o idealizador e diretor criativo Rodrigo Costa, fizeram alí uma cobertura jornalística que colocava o olhar da favela como protagonista. No ano seguinte, o material foi exposto no Meeting of Favela (MOF), grande evento de grafite voluntário que acontece todo ano na mesma Vila Operária.

FUGAZ: Quantas pessoas estiveram envolvidas nessa produção, de ponta a ponta? Como planejaram essa pauta?

CENA BXD: Ao todo, nove pessoas participaram da produção. A pauta surgiu após a cobertura do primeiro ato nas Laranjeiras, que foi desenvolvida pelo Rafael Alves na fotografia e pela Lenice na redação. Rafael mandou as imagens e nos engajamos no desenvolvimento do primeiro conteúdo para o Instagram. Com essa primeira publicação se criou um consciente coletivo para falarmos sobre as manifestações no eixo RJ – SP. 

Com a previsão do segundo ato nos mobilizamos para fazer uma cobertura com um olhar mais profundo para as informações em torno dos acontecimentos, pois vivíamos um momento específico da pandemia mundial em que sair de casa para manifestações estava sendo questionado por segurança contra COVID-19.

Marcamos um encontro online pelo Google Meet entre a equipe que participou do desenvolvimento da publicação do primeiro ato (Rafael Alves, Lenice, Rodrigo Costa e Rapha Sancho) e as outras pessoas que entraram na proposta para ampliar a ressonância sobre o tema (Jade, Naiara, Kellyan e Ed Daltônico). 

  • Fizemos uma breve introdução com base no material do Rafael e da Lenice para compartilhar uma situação de vivência no campo em pandemia após contínuos casos de racismo.
  • Nos aprofundamos na pauta com cada integrante compartilhando o seu ponto de vista sobre a temática. Territorialismo sempre é importante para nós. Com as diferentes perspectivas dos integrantes, concluímos que um ponto importante não era apenas as pessoas que estariam presentes na manifestação, mas também aqueles que não podiam ir porque são ou moram com alguém do grupo de risco, e até mesmo pessoas que não tinha transporte público disponível para ir até o local do ato. Essa era a realidade de muitas pessoas naquele momento. Até dentro do nossa equipe existiu essa variação de pessoas que poderiam estar no “campo” e outras que não poderiam. Esse pensamento fez sentido para entender a relevância do conteúdo que iamos entregar e para forma como iamos produzir.
  • O Hanier entrou na proposta após a reunião, pois tínhamos apenas o Sancho como fotógrafo em SP e seria necessário um olhar para redação de alguém que estivesse vivendo com ele a manifestação.
  • Usamos um grupo no whatsapp para trocarmos informações e continuar o processo criativo que teve início na vídeo chamada.

Jade marques – Rio de janeiro

FUGAZ: Vocês cobriram atos no Rio e em São Paulo. Observaram alguma diferença ou particularidade entre os atos daqui e os de lá?

CENA BXD: Percebemos uma divisão de discursos anti fascistas e anti racistas que se desenrolou no grupo. No Rio de Janeiro tinha dois atos “marcados”, um na Zona Sul e outro no Centro, e não queríamos deixar de cobrir. Tínhamos duas pessoas responsáveis pela fotografia e seria tranquilo dividir um para cada ato, mas no grupo chegamos a conclusão de que deveríamos acompanhar o ato em que nossos “pares” estão convocando. Ou seja, quem se faz presente na pauta anti racista muito antes do caso Floyd ganhar repercussão mundial. Isso determinou um recorte para nossa cobertura. Lógico, sem desvalorizar quem virou a chave nesse momento, mas a nossa busca era por profundidade.

Rafael alves – Rio de janeiro

FUGAZ: Uma das coisas que nos chamou atenção na produção de vocês foi a forma com que abordaram o debate que estava rolando nas redes, às vésperas do ato, conduzida por diferentes rappers do país. O que levou a escrever aquele texto? O que vocês perceberam que estava acontecendo?

CENA BXD: (hanimec57) O que me levou a produzir aquele texto foi a percepção de que em momentos cruciais, a gente quase sempre tende a criar mais divisão. Acredito que um olhar mais estratégico pode revelar como discursos e narrativas que parecem conflitar, podem ser percebidas como complementares dentro dos inúmeros desafios que temos na vida.

Assim, reconhecemos que antes de mais nada, precisamos urgentemente de nos aproximar, de perceber as oportunidades de criar proximidade entre os nossos. Até hoje, a divisão sempre jogou a favor de quem continua lucrando e aumentando o lucro, mesmo em meio a uma pandemia. Então, depois de 7 anos dos protestos de 2013, ver o que rolava pelo mundo, simplesmente me despertou um pensamento de que precisamos ter cuidado inclusive conosco, em não cair no imediatismo de apontar pra quem é seu aliado, mas focar nas qualidades das pessoas que estão com a gente e assim superar os desafios que existem na nossa sociedade, um a um.

É tipo a resposta que Basquiat deu numa entrevista ao ser perguntado se sentia raiva. Ele respondeu: “Raiva? Sim, sinto. Mas não lembro.” Focar nos pontos positivos daqueles com quem construímos é importante, inclusive para criar redes e parcerias de longo prazo.

RIO DE JANEIRO 

SÃO PAULO 

Deixe um comentário

Preencha os seus dados abaixo ou clique em um ícone para log in:

Logo do WordPress.com

Você está comentando utilizando sua conta WordPress.com. Sair /  Alterar )

Imagem do Twitter

Você está comentando utilizando sua conta Twitter. Sair /  Alterar )

Foto do Facebook

Você está comentando utilizando sua conta Facebook. Sair /  Alterar )

Conectando a %s